quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Viagens que não terminam

Andei com um pouco de dificuldade para postar algumas outras coisas aqui, mas acho que vocês irão entender. Isso de seguir caminhando pode render algumas histórias interessantes. No melhor dos casos, viagens podem nos porporcionar bons encontros. Talvez com o tempo eles podem ir melhorando e quando nos damos conta, uma grata surpresa esta diante de seus olhos. Não estou bem certo de como fazer para termos sempre bons encontros - na verdade acho que isso nem é possível - mas certamente ajudar o "destino" para proporcionar uma melhor chance de isso acontecer, até que me parece algo mais razoavel.

Desde que retornei ao Brasil, a quase 2 meses, ainda fico pensando sobre essa condição de "regresso" e o que ela pode significar. Ainda estou bastante curioso sobre as coisas que me cercam e o que fiz de mim mesmo nos últimos quase 2 anos. Pensava que iria permancer em São Paulo a maior parte do tempo assim que voltasse a pisar nessa terra, mas acontece exatamente o oposto. Continuo viajando! Até porque tem sido uma boa forma de lidar com a angústia de voltar também. Mas agora por regiões mais tranquilas, com outra diferença, mas não menos curioso. E foi numa dessas recentes caminhadas que fui parar em Góias no mês de novembro. Precisamente Cidade de Goiás e Goiania. Passei quase 10 dias por lá.

A Cidade de Goiás é antiga, a primeira a ser fundada no Estado, foi a capital se não me engano até os anos 50 quando transferem essa condição para Goiania e também importante ponto de convergência dos primeiros bandeirantes nos idos de 1600.

Alí tem um rio chamado Vermelho. Conta a lenda que foi nas margens desse rio que o bandeirante Anhanguera assim que chegou na região, entrando em contato com indígenas usou de uma estratégia bem curiosa para conseguir o "apoio" dos locais. Colocou fogo numa bacia com álcool e disse que sem eles não fossem respeitos e obedecidos iriam fazer o mesmo com o rio. Acho que nem preciso dizer o que aconteceu depois, né? Enfim, acontece que como em muitos outros locais por onde esses ilustres bandeirantes passaram, ainda encontramos diversas homenagens a eles. A cidade de Goiás também não é diferente e até hoje existe esse clima meio "você sabe com quem esta falando?". Esta lá perto do centro uma cruz com o nome do dito cujo. O bom é que sempre existem dissidentes, inconformados, pessoas que preferem agir do que apenas se lamentar. Um projeto incrível com crianças pobres, um padre macumbeiro, ativistas do movimento negro, uma capoeira angola ótima, um mosteiro com monges comunistas e outras coisas. Vamos a elas!

Descubro que o municipio de Goiás possui um dos maiores índices de assentamento na relação território x população. Fico intrigado a respeito de um Estado tão conservador possuir tamanha mobilização pró reforma agrária. Descubro então que isso se deve bastante a atuação direta dos religiosos católicos da cidade. Desde 1977 existe na cidade o Mosteiro da Anunciação do Senhor. Alguns monges beneditinos que viveram e vivem alí são também ótimos socialistas! Explico.

Em 1961, atendendo a um apelo de João XXIII, o mosteiro de Tournay, na França, enviou oito monges para Curitiba. Lá começou a história do Mosteiro da Anunciação do Senhor, quando depois foi transferido para Goiás. Acontece que esses monges foram soldados na Segunda Guerra e lutaram contra a ocupação nazista na França. Muitos entraram em contato com a idéias socialistas e quando chegaram ao Brasil, uma das missões era justamente trabalhar com a população mais desfavorecida economicamente. Esses monges tiveram um importante papel no surgimento da Teologia da Libertação. Trabalham anos a fio com os movimentos sociais e ainda são (aqueles que estão vivos, claro) figuras de grande relevância como líderes espirituais e políticos de muitas pessoas e grupos de esquerda. O Mosteiro é aberto para visitas e para pessoas interessadas em permanecerem lá por mais tempo. Voces pode ver e saber muito mais em http://www.empaz.org/

Depois escrevo mais sobre essa experiência em Goiás.

Abraços.

A igreja do mosteiro. No fundo, um painel esculpido com a santíssima trindade. Pai, filho e espirito santo representados na figura de um negro, um índio e uma mulher. Na direita um Cristo negro.

Tudo é feito de modo circular. No fundo a imagem da Virgem de Guadalupe, padroeira da América Latina.

A Capela.Meu guia: monge Pedro. Gente muito boa! Um dos franceses que lutaram na Segunda Guerra e segundo ele, comunista...

No fim da rua, a cruz do Anhanguera. Só pra constar: em 2001 uma forte chuva inundou parte do centro histórico e a cruz acabou caindo e sendo levada pela enchurrada. Ela passou anos desaparecida e uma réplica foi erguida em seu lugar, mas muitas pessoas achavam que não fazia sentido homenagear alguém que causou tanta dor em sua época. A cruz acabou aparecendo ninguém sabe como e está hoje no Museu das Bandeiras.


Rio Vermelho

Museu das Bandeiras. O edíficio funcionou como cadeia e um tipo de juizado até 1951, quando foi tombado, junto com o restante do centro da cidade. Na frente do prédio, os escravos eram colocados a venda e os senhores das fazendas vinham para compra-los. O açoite era feito ali mesmo e a forca funcionava nos fundo.

Vista noturna de uma rua do centro histórico da Cidade de Goiás.

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