terça-feira, 31 de julho de 2007

para uma parte do Japão...


Karnak - O Mundo
André Abujanra

O mundo é pequeno pra caramba
Tem alemão, italiano e italiana
O mundo filé milanesa
Tem coreano, japonês e japonesa

O mundo é uma salada russa
Tem nego da Pérsia, tem nego da Prússia
O mundo é uma esfiha de carne
Tem nego do Zâmbia, tem nego do Zaire

O mundo é azul lá de cima
O mundo é vermelho na China
O mundo tá muito gripado
O açúcar é doce, o sal é salgado

O mundo caquinho de vidro
Tá cego do olho, tá surdo do ouvido
O mundo tá muito doente
O homem que mata, o homem que mente

Por que você me trata mal
Se eu te trato bem
Por que você me faz o mal
Se eu só te faço o bem

Todos somos filhos de Deus
Só não falamos as mesmas línguas
Todos somos filhos de Deus
Só não falamos as mesmas línguas

Everybody is filhos de God
Só não falamos as mesmas línguas
Everybody is filhos de Ghandi
Só não falamos as mesmas línguas

Entrevista para ANA


Dei uma entrevista para a Agência de Notícias Anarquistas - ANA.
Falamos bastante sobre o Japão.
Esta aqui na integra a primeira parte. Quando sair a segundo volto a publicar.
Abraços.
Tchau!


"Chega a dar náusea como os japoneses absorvem o lixo da sociedade de consumo nos moldes estadunidense"

A frase acima foi dita pelo anarquista Alessandro Campos, um brasileiro de São Paulo, que atualmente mora no Japão, na cidade de Ogaki. Ele está lá há 4 meses. Por outro lado, com uma sensação de contrastes entre o "moderno e o tradicional", Alessandro exalta a quantidade de bicicletas nas ruas japonesas. "As bikes estão por todos os lados. As pessoas usam como lazer e transporte. Crianças e velhos, gente engravatada ou com salto alto, estudantes", diz. Na entrevista que concedeu à ANA - dividida em duas partes - ele discorre sobre outros temas pertinentes ao "universo anarquista", como meio ambiente, alimentação, medicação, xenofobia, prisões... Tudo como tema central o Japão, sob um olhar libertário e "estrangeiro". Confira a seguir a primeira parte da entrevista.

Agência de Notícias Anarquistas > Vamos começar essa entrevista assim: faz de conta que alguns dos seus amigos estão indo para o Japão, como você apresentaria a cidade que atualmente mora para eles, Ogaki?

Alessandro Campos < Ogaki é um lugar relativamente pequeno. Uma cidade com um pouco mais de 140 mil habitantes. Um local bem antigo e com importante papel na história do Japão. Está bem próximo da região de Sekigaraha, onde teve a importante batalha de Sekigaraha, quem leu Musashi vai saber... (risos) Que definiu os rumos da história do Japão por pelo menos 3 séculos desde 1600 quando teve início o período não oficial do xogunato onde os samurais tiveram importante destaque. Aqui também foi onde o poeta Bashô viveu seus últimos anos. Existe uma expressiva comunidade de latinos, principalmente de brasileiros e peruanos, mas também há chineses. É comum encontrar pessoas falando seus respectivos idiomas nas ruas. Acho que vale dizer que sempre que alguém chega aqui fica impressionado com o contraste entre a alta tecnologia (por exemplo, andar no shinkansen, ou o trem bala) e o que está preservado desse passado que acabei de falar. Tudo está muito organizado, funcionando pontualmente e as pessoas de um modo geral são bastante educadas. Muitas e muitas bicicletas e muitos e muitos guarda-chuvas. Isso é interessante. Em dia de chuva você sempre encontra um guarda-chuva que pode usar deixado em alguma estação ou supermercado, como se passasse de mão em mão. E com a bicicleta é a mesma coisa. Um dia fui sair com a minha bicicleta e descobri que pegaram ela "emprestada", deve estar em alguma estação de trem por aí esperando por alguém. (risos)
Mas também pode ficar bastante surpreso com o nível de consumo em que vivem os japoneses aqui. A cidade possui 3 shopping centers e tem mais um sendo construído. Eles aprenderam bem a cartilha do tio nazi sam e seu "american way of life". Chega a dar náusea como os japoneses absorvem o lixo da sociedade de consumo nos moldes estadunidense. Salta aos olhos como tudo é tão descartável e volúvel.

ANA > Muitos guarda-chuvas? Quer dizer que aí chove mais que São Paulo, capital? (risos)

Alessandro < Se chove mais eu não sei, mas agora que estamos no verão sempre é bom ter um guarda-chuva por perto...
Eu não sei desde quando é assim aqui, mas se começa a chover e você vê um guarda-chuva pendurado em algum lugar não fique inibido, pode usá-lo e depois deixar em algum outro lugar para outra pessoa poder usar também.

ANA > Diz-se no Brasil que o lixo no Japão é um “luxo”, que podemos encontrar geladeiras, televisores, computadores etc., tudo seminovo. É verdade? (risos)

Alessandro < É verdade. Não que isso ocorra por toda parte, mas você pode encontrar essas coisas jogadas por aí sim, ou ainda de pessoas que estão tentando se desfazer de algumas coisas porque querem algo novo. Você não pode simplesmente colocar seu lixo do lado de fora e esperar que ele desapareça. Há coleta seletiva e dependendo do volume do "lixo" você mesmo deve dar um jeito nisso. Por isso às vezes você encontra essas coisas na rua. A manutenção também acaba sendo inviável de tão cara, é mais fácil comprar outro. Lógica estúpida da sociedade de consumo, afinal você precisa fazer a economia se movimentar e estar por dentro das novidades.

ANA > Quanto à bicicleta, então podemos afirmar que a relação dos japoneses com a “magrela” é muito mais intensa que no Brasil, que é um meio de lazer e transporte que faz parte do dia-a-dia do japonês?

Alessandro < Isso realmente é interessante. As bikes estão por todos os lados. As pessoas usam como lazer e transporte. Crianças e velhos, gente engravatada ou com salto alto, estudantes... Em toda estação de trem há um bicicletário com espaço para centenas, às vezes milhares delas. E com a bicicleta acontece o mesmo que com o guarda-chuva, vai passando de mão em mão, mas com menos freqüência, já que nem sempre é algo barato e fácil de ter uma boa bike, então você a tranca, apesar de ser algo muito acessível. Dê uma olhada nisso pra ter uma idéia: www.photopassjapan.com/jitensha

ANA > E há respeito aos ciclistas? Ciclovias... Como é essa relação ciclistas e motoristas no Japão?

Alessandro < Existem muitas ciclovias sim e a calçada geralmente é dividida para ciclistas e pedestres. Caso falte espaço, você pode ir pra rua e os carros devem manter uma distância segura de você. As auto-escolas são obrigadas a dar essa orientação, mas as pessoas no geral são muito cautelosas e existe uma grande preocupação com a segurança física das pessoas na rua. Caso haja algum acidente com ciclista, o motorista do carro na maioria dos casos já é considerado culpado. Isso porque a bicicleta está em situação de maior vulnerabilidade. O motorista deve arcar com todos os gastos que o ciclista venha precisar, como médico, reparo da bicicleta etc. No caso de um carro matar um ciclista, legalmente o motorista deve pagar uma considerada indenização para a família da vítima, além da suspensão imediata da habilitação. Caso esse ciclista seja a pessoa responsável pelo sustento da família, o motorista deve pagar indenização vitalícia ou no caso de dependentes jovens, até eles completarem a maior idade, que aqui é aos 20 anos. E tem que pagar mesmo, se não leiloam o carro, a casa ou qualquer outra coisa que a pessoa tenha. A questão do direito penal aqui é bem diferente do Brasil. Você ficou sabendo do ministro que cometeu suicídio mês passado porque foi acusado de corrupção? Às vezes quase da vontade de gostar do Estado quando você vê políticos do mais alto escalão da burocracia estatal sendo julgados e condenados há anos e anos de prisão... (risos)

ANA > E verde, existem muitas áreas verdes em Ogaki?

Alessandro < Sim, há muitas áreas e parques pela cidade, a maioria pequena e é interessante ver como as pessoas às ocupam nessa época do ano. Muitos músicos vão para esses parques ensaiar. Já conheci alguns japoneses exatamente nesses lugares quando estava tocando meu berimbau e eles me perguntando que diabos é isso!

ANA > Na questão de meio ambiente, o que te desagrada, que acha uma aberração no Japão?

Alessandro < Sem dúvida o consumo e a produção de lixo. Até que existe uma educação interessante na reciclagem do lixo, mas a produção é tanta que não sei dizer como fica. A idéia de reduzir e reutilizar praticamente não existe. Toda prefeitura orienta como fazer a separação do lixo, mas nenhuma palavra para reduzí-lo, apesar de existir um sistema de etiquetas oferecidas por residência para colar em cada saco de lixo e se você extrapola essa quantidade deve comprar mais. Uma tentativa de limitar a produção como um todo, mas pouco eficiente na minha opinião, já que é muito simples ter novas etiquetas. Veja só como é: você vai ao supermercado e compra um pacote de doces. Esse pacote é uma embalagem maior que contêm uma embalagem menor. O doce está dentro de uma embalagem menor que embrulha apenas ele. Cada doce está embrulhado individualmente. No caixa a pessoa te dá mais um saco plástico para você levar pra casa. E em casa vai tudo para o saco de lixo. Com exceção do lixo reciclável, tudo é incinerado, inclusive o plástico. E assim vai, com praticamente tudo.

ANA > Há no Japão também essa busca desenfreada por energias?

Alessandro < Como em toda parte o Japão não foge a regra. O petróleo ainda é o que predomina, principalmente pelo fato do Japão não contar com usinas hidroelétricas e nenhum tipo de extração mineral significativa. O lobby automobilístico ainda insiste no uso de gasolina comum e outros derivados.
Não sei bem como está agora, mas existiam muitos projetos para uso de energia nuclear, principalmente para fins militares, já que o Japão nunca saiu dos seus impasses com a China e a Coréia do Norte. Mas o uso de energia nuclear é preocupante. Quase 30% da energia aqui vem de usinas nucleares.
Acontece que em um país com tantos registros de terremotos e catástrofes naturais, como garantir que o uso disso seja seguro? No dia 16 de julho a província de Niigata sofreu um terrível terremoto que destruiu 900 casas, estradas, ferrovias, deixando mais de 25 mil casas sem energia elétrica e outras 35 mil sem água e gás. 10 pessoas morreram e mais de 12 mil foram evacuadas por conta do vazamento da usina de Kashigawazaki-Kariwa. Essa usina é a maior do mundo por capacidade de produção. Existem 55 usinas nucleares no Japão. Uma grande quantidade de água contaminada vazou para o mar do Japão e os responsáveis pela usina simplesmente pediram desculpas pelo transtorno dizendo que o terremoto foi maior do que eles esperavam e não estavam preparados para tanto. O terremoto foi de 6,8 na escala Richter.
Sei de algumas iniciativas com o uso do lixo, combustível vegetal, energia solar e eólica, mas não me parece algo muito expressivo.

ANA > No Brasil você estava ligado à luta antimanicomial. No Japão existe tal movimento?

Alessandro < Não há nada parecido. Aqui ainda o modelo de atendimento em saúde é muito hospitalocêntrico, ou seja, encarceramento do "doente" e o médico como figura central do tratamento. A psicologia e a psiquiatria deixam muito a desejar, não consigo imaginar um movimento como o do Brasil que reúne não apenas usuários dos serviços e seus familiares, mas também os profissionais. O Movimento da Luta Antimanicomial do Brasil acabou sendo para o mundo todo uma importante referência de transformação nesse sentido. A questão de movimentos sociais no Japão ainda é uma incógnita para mim. Mesmo em outras questões. Existem grupos de direitos humanos, ecologistas, sindicalistas, grupos humanitários, um povo mais de esquerda mesmo que reformista, mas ainda não sei se existe algo que poderia ser chamado de movimento social.

ANA > Atualmente as empresas farmacológicas mais importantes do planeta são dos Estados Unidos, Europa e Japão, controlam mais de 50% do mercado mundial dos medicamentos, da chamada “medicação da vida". No Brasil há farmácias praticamente em cada esquina, no Japão acontece o mesmo?

Alessandro < A mesma coisa. As farmácias parecem mais supermercados do que um lugar para medicamentos. Por outro lado existe uma grande contradição para conseguir alguns medicamentos, como por exemplo, anticoncepcionais. A venda de anticoncepcionais é feita somente com prescrição médica, todo mês a mulher deve ir até um médico para adquirir uma cartela determinada por ele. Isso acaba sendo uma forma de manter o controle sobre a mulher e não lhe possibilita muita autonomia. O que às vezes é difícil de entender é que o aborto no Japão é legal em todos os casos, mas nessa situação talvez podemos atribuir isso ao fato do Japão não ser um país cristão e também a herança do período pós-guerra. Mas voltando a questão da indústria, é difícil como em todos os lugares, conseguir dados e informação séria sobre isso. Tudo aparece como uma coisa positiva do "progresso" e do desenvolvimento capitalista. Quem não se lembra do caso do laboratório japonês que tentou patentear o cupuaçu e depois o açaí? Ou então da quantidade de terras que eles vêm comprando, principalmente no pantanal mato-grossense por conta da água? Os japoneses batem palmas e se orgulham de fazer parte do G8, mas a maioria da população ignora o fato de fazer parte dos que mais exploram e destroem o planeta.

ANA > Quer dizer que o japonês consome muito remédio?

Alessandro < Acredito que sim, ainda mais se considerarmos os altos índices de suicídio e stress. A pressão para conseguir ascensão social é muito grande e desde pequenas as pessoas são cobradas nisso. Não são raros os casos de crianças que cometem suicídio, apesar disso estar também ligado a maus-tratos na escola. Por um lado à dedicação ao trabalho faz com que tudo seja feito da melhor maneira possível, com grande senso de disciplina e organização, mas por outro isso provoca muitas formas de patologias, já que as pessoas dedicam pouco tempo ao lazer e atividades mais lúdicas. A alimentação também não ajuda, cada vez mais as pessoas se alimentam em fastfoods, cheios de carnes e gorduras.

ANA > Estresse, depressão, desequilíbrios psíquicos, são enfermidades, patologias comuns no Japão?

Alessandro < Foi como disse: a pressão social é muito grande. As pessoas passam muito tempo dedicadas aos estudos e ao trabalho e quando não conseguem os resultados esperados acabam desenvolvendo muitas patologias. O fato de ser uma cultura que não expressa sentimentos de forma tão direta e explícita, a frustração seja ela grande ou pequena, acaba não sendo trabalhada. Não sei te dizer a quantidade de pessoas atingidas por esses males, mas com certeza não é pouca. Essas são coisas que atingem o mundo inteiro hoje, um problema planetário mesmo e acredito que em sociedades que valorizam a competição, a hierarquia e outras maneiras de disputa e desigualdades, desenvolvem isso em um ritmo acelerado. Primeiro pelo preconceito que há em relação às pessoas que passam por períodos difíceis e necessitam de algum tipo de apoio psicológico, e depois por falta de políticas públicas de saúde mental.
No caso do Japão é normal pessoas, principalmente em fábricas como as que os brasileiros trabalham, realizarem jornadas de trabalho de 12, 15 horas diárias, seis dias por semana. Elas vão para suas casas apenas para dormir. Quando apresentam algum quadro patológico desses ou de insônia, pânico, fobias, que é bem comum, tentasse fazer com que o trabalhador peça demissão e assuma o problema como algo individual. O capitalismo gera patologias graves e isso não pode ser ignorado.

ANA > Provavelmente por ignorância imaginava que no Japão existisse um hábito alimentar mais saudável, mas pelo que diz não, que a industrialização da alimentação ganha espaço. Fale um pouco mais desse panorama hoje no Japão, dessa tal “alimentação moderna”.

Alessandro < Cada vez mais as pessoas gastam seu tempo trabalhando. Naturalmente elas comem muito mais fora do que em casa. Possuem pouco tempo para almoçar e jantar, seja no trabalho ou em casa, ou ainda quando saem de um e vão para o outro não estão dispostas a preparar sua própria comida ou mesmo espera por isso. Acabam preferindo a agilidade das redes de fastfood ou lugares que oferecem pratos prontos, mas nada saudáveis. Hoje é comum as casas japonesas terem fogão de apenas uma boca, no máximo duas. Parecem mais com um fogareiro de acampamento! Acho que fogão de seis bocas nem existe aqui... (risos) Não sei bem se sempre foi assim, mas assim é mostrado agora.
Os japoneses comem naturalmente menos do que nós. Fico pensando se ainda existe um sentimento com relação às inúmeras épocas de escassez que eles viveram, foram muitas guerras e desastres naturais que não permitia o excedente de comida. Agora isso está mais distante e eles também querem experimentar outras coisas, basta pagar.

ANA > É comum encontrar japonês obeso?

Alessandro < Não vejo muitos japoneses obesos, mas claro que existem. O hábito da bicicleta acaba fazendo muito bem também e eles comem muito arroz sempre. O Japão também vive a ditadura da beleza magra difundida pelos meios de comunicação de massa. Isso é uma coisa a ser considerada, mas ainda não saberia te falar bem como ela é desenvolvida aqui.

ANA > E um vegetariano come bem no Japão? Ouvi dizer que os preços das hortaliças e frutas no Japão são altíssimos. É isso mesmo?

Alessandro < Ser vegetariano no Japão é um tormento constante! Desista de comer em mais da metade de todos os restaurantes que você pensar em ir... (risos) Muitas vezes eu fui para um restaurante comum ou mesmo um lamen ya (que é uma casa de macarrão tipo miojo, muito popular aqui, onde você come muito por pouco) e não encontrei nada para comer, nem batata frita... (risos) Vegan não quero nem pensar... Desista de 80% dos restaurantes. Os japoneses comem muita carne e preparam tudo com ela. Às vezes só mesmo sushi de pepino e missôshiro (caldo de pasta de soja com tofu).
Um vegetariano só vai comer bem se for em um restaurante vegetariano, que por sinal são poucos (em Ogaki não tem nenhum, mas na região de Nagoya tem uns 2 e outros 3 com algumas opções veg. no menu) ou se você fizer sua própria comida. Você pode escolher melhor as coisas e prepará-las em uma quantidade razoável. Quanto ao preço das coisas não dá pra comparar. No geral são bem caras sim, mas as pessoas possuem um poder aquisitivo melhor. Mesmo assim existem alimentos que são caros pra todo mundo, frutas como melancia e melão podem chegar a custar meio dia de trabalho de um operário. Uma única maçã pode chegar a custar 5,00 reais. Frutas como mamão, pêra, côco, enfim, frutas tropicais, quase não existem frescas, só em conserva e custam o olho da cara. O problema também é a variedade e a gente sempre acaba comendo as mesmas coisas. Muita banana e muita salada de alface e tomate... (risos) O bom é que hoje existem algumas lojas que importam produtos do Brasil e às vezes dá pra comprar umas polpas de suco do tipo cupuaçu, goiaba, graviola, frutas do norte e nordeste para matar a saudade!

ANA > Apesar de haver acordos internacionais que proíbem a caça de baleias, sabe-se que o Japão, representados na indústria da pesca, mata centenas, quiçá milhares de baleias por ano, inclusive outros mamíferos marinhos, como golfinhos, lobos marinhos, etc., tudo para consumo alimentar. Um tempinho atrás eu vi um vídeo chamado “Earthlings” que me deixou chocado e revoltado, que mostrava a matança absurda de golfinhos no Japão, e depois a carne era vendida como se fosse de baleia. Há no Japão uma luta efetiva contra essa estupidez, ou a sociedade japonesa encara tudo como “tradição cultural”?

Alessandro < Isso sobre tradição cultural é sempre um desafio, né? O problema nem sempre é identificar de fato as raízes e a justificativa de se preservar uma tradição, mas saber quem é que ganha com isso. A necessidade realmente é coletiva ou é um interesse particular? Acho que o caso da matança de baleias e outros animais são assim. Pouca gente ganha com isso aqui. Não é o pequeno pescador que vai para o alto mar atrás desses animais. São grandes navios, alguns bem aparelhados com sondas de última geração e grandes arpões eletrônicos. Uma indústria que poucos controlam. Isso é algo muito caro também e bastante restrito. As pessoas não chegam no Japão e dizem: "ei, eu quero comer baleia, onde tem?" Não tenho certeza, talvez em algum pequeno vilarejo costeiro existam pessoas que tenham sim uma ligação ancestral com esses animais e se alimentem deles, mas a verdade é que o Japão como um todo não tem. Não há justificativa comunitária ou nativa como eles insistem em dizer.
Quando o governo tenta justificar isso e se faz valer de um discurso com peso nas suas tradições, ele o faz de maneira hipócrita, dissimulada e bem cínica. Eles tentam então tirar proveito de várias formas. As pessoas ainda têm uma visão muito estereotipada dos japoneses e de sua cultura. Eu não escapei disso. Ficamos imaginando que existe um código samurai, uma honra cheia de sangue azul por todos os lados. Hoje, apesar do pouco tempo que estou aqui, vai ficando claro pra mim que o que funciona pra valer aqui é justiça penal, o direito. Claro que existe uma moral e um juízo de valor bem peculiar, um modo de viver em sociedade muito particular, mas o fato das leis serem aplicadas com muito mais rigor faz as pessoas se comportarem de um jeito mais "civilizado". As pessoas aqui fazem muitas coisas erradas e se tivessem oportunidades fariam muito mais. Se tem algo que corresponde um pouco melhor a realidade é a preocupação excessiva com a opinião pública, com o que "os outros vão dizer", e isso faz com que todos tomem muito cuidado com o que quer que façam. Precisamos levar isso em consideração para ver um pouco melhor como o controle da sociedade pelo Estado atua. O governo japonês chega ao absurdo de justificar a matança de baleias dizendo que elas causam danos para a pesca porque se alimentam de outros peixes menores.
Infelizmente eu não sei muito como está atualmente essa questão da pesca de golfinhos e baleias aqui. O pouco material que é publicado está em japonês e sempre é a favor da pesca. O Greenpeace é quem chega a fazer algumas denúncias mais bem articuladas. Todos sabem que as baleias quase se extinguiram e que se fosse pelo Japão e pela Islândia isso teria acontecido. A maneira que os japoneses encontraram para não parar com a pesca, burlando os acordos internacionais, foi a justificativa do uso científico, mas isso também não é respeitado. Na região de Tóquio sei que existem cerimônias públicas para a limpeza e a preparação da baleia para consumo. Eles chegam até a distribuir para as crianças das escolas da região numa tentativa de ganhar a opinião pública e educar as futuras gerações para não acharem isso errado.

domingo, 29 de julho de 2007

O HANABI

Talvez uma boa tradução para hanabi seja flor em fogo ou flor de fogo. Hana=flor e bi=fogo. Um festival que acontece por todo Japão durante o verão. Dá para imaginar uma hora e meia de queima de fogos de artifícios? Pois é esse o tempo em média que dura cada festa! Quando a queima tem inicio ela praticamente não para.





As pessoas vão chegando cedo, antes do anoitecer, muitas mulheres vestidas com yukata (um kimono de verão), algumas levam suas cadeirinhas, outros vão espalhando seus acolchoados pelo chão de terra, se acomodando pacientemente para ver esse lindo espetáculo.
























Acontecem centenas deles por aí e ontem aconteceu o de Ogaki, cidade onde moro. Fui de bicicleta até onde seria a festa e esperei pelo inicio do que seria meu primeiro hanabi. Não tinha certeza de como era, afinal mais de uma hora de fogos de artifício me parecia um certo exagero. Ainda bem que estava enganado. Foi realmente bonito, tranquilo, cheio de movimento e cores. Sem falar na lua linda que fez (puts! isso tá ficando meio hippie, né?) Durante todo verão e início de outono existem muitos tipos de festivais pelo Japão, incluindo carnaval. Eu vou contando se for em mais algum. As fotos tentam mostrar um pouco como foi, mas ao vivo é sempre melhor, não?
Depois na hora de ir embora, minha bicicleta parecia não pesar! Cada pedalada parecia ainda sentir uma flor de fogo nascer. Espero conseguir ver outros antes do inverno chegar.



sabishisa ya hanabi no ato no hoshi no tobu

Solidão.

Após a queima de fogos,

Uma estrela cadente.

Shiki

sábado, 28 de julho de 2007

A respeito da difícil arte de discordar.

...apesar de tanta correria sempre sobrou um tempinho para encontrar os amigos e os amigos dos amigos pra jogar um pouco de conversa fora. Exatamente nesse tempo pensamos em muitas coisas e formam-se pequenos debates, interlocuções sobre o mundo e divergências a respeito de tudo e de nada. Fiquei pensando sobre o ato de discordar. Gostaria de pensar que essas discordâncias se dão pela fato de cada vez mais pessoas estarem melhor informadas e se dedicando a estudar coisas um pouco mais sérias e honestas, mas creio que infelizmente não. Será pela pouca capacidade de sermos contrariados? Afinal, porque é tão difícil de sermos contrariados?
Como se o fato de não aceitar o que o outro pensa e fala fosse uma obscena ofensa. Acontece que nem sempre conseguimos ficar tranquilos e indiferentes (mesmo?) quando ouvimos barbaridades de pessoas que dizem ter certeza sobre o que opinam porque leram na Veja ou assistiram no Jornal Nacional. Porém para além disso, discordar as vezes é interpretado como um dedo na cara que diz: “ei, eu não gosto de você!” Opiniões nem sempre estão em busca de aprovação, mas sem dúvida não é sempre também que podem se dar ao luxo de dispensar um reflexão conjunta e é nisso que consiste a discordância. Alguém disse certa vez que poderia não concordar com nada sobre o que dizia seu interlocutor, mas até o último momento ele defenderia o direito de ser dito. Vejo que quando uma pessoa discorda de outra seu rosto se transforma, um bocejo aparece, o olhar não se atenta mais, temos interrupções seguidas, a boca se contorce numa careta de desdêm e por aí vai.

Escutar coisas que nos contrariam tem sido quase um convite a guerra. Acabamos por perder uma ótima oportunidade de aprender sobre um outro ponto de vista, e mais ainda, sobre COMO as pessoas se posicionam. Isso pode nos ajudar a entender onde tudo aquilo que discutimos vai parar. Explico com algo que presenciei a alguns anos atrás. Eram meados de 2000 e estava em um debate sobre questões de gênero e amor livre entre anarquistas no antigo ICAL, espaço libertário que existiu na Vila Madalena, São Paulo. Não me recordo de todos que estavam compondo a mesa, mas quero falar de um querido conhecido que estava lá, o Eduardo Valadares. Uma pessoa muito bacana e extremamente lúcida em seus argumentos. Algo foi dito (não lembro exatamente o que) e um outro amigo fez uma observação. Era o Velot, criatura das mais inteligentes que já conheci. Em pouco tempo eles estavam a plenos pulmões (ambos possuem um modo bastante enfático e entusiasmado de dizer as coisas...) discordando plenamente um do outro. O mediador do debate chegou a tocar no ombro do Edu e pedir para ele ficar mais “tranquilo”, relaxar... O Edu deu uma boa risada e respondeu: “Calma? Mas é o Arthur! E na verdade eu só discordo assim com aqueles que acredito valer a pena.” Eu nunca mais esqueci isso.
De um modo geral eu gosto muito de uma boa polêmica, mas começo a entender melhor o que o Edu estava dizendo. Não se trata de discordar para convencer, mas pelo prazer do desafio que isso pode significar e esse lugar devo reconhecer, nem sempre é facíl de encontrar. Fico com a imagem de uma pessoa muito interessante que infelizmente já morreu e que era mestre das discordâncias, Mohandas Gandhi. Esse indiano que perambulou nesse planeta falou certa vez que o que precisava ser combatido não era o pecador, mas o pecado, em outras palavras que suas ações não eram voltadas para um pessoa em particular, mas para o mal que ela causava. A idéia de não-cooperação com o que esta errado reside aqui e sua desobediência civíl consistia nisso. Mostrou uma ótima maneira para saber como distinguir uma coisa da outra e para nos ajudar em verdadeiras conquistas. Quando discordar de alguém e tentar fazer algo a respeito observe isso: primeiro eles te ignoram. Depois eles tentam te ridicularizar. Na sequência ficam bravos e talvez passem para a agressão. Quando eles te agredirem, você vence.
Sigo em frente, se não discordando mais, pelo menos tentando discordar melhor.


quinta-feira, 26 de julho de 2007

Início

Resolvi fazer um blog. Não sei bem o que vai acontecer, mas acho que pode ser uma boa maneira de falar mais com os amigos e eles poderem saber o que anda acontecendo, e também conhecer novas pessoas. Falar de lugares que passei e contar histórias que escutei. Falar de coisas boas e desafios, tentando diminuir a saudade de casa... Acho que vai ter de tudo, desde do punk japonês aos vários problemas com a comunidade brasileira.
Resolvi iniciar isso colocando um texto/relato que escrevi assim que cheguei no Japão. Algumas pessoas já leram e outras não, mas penso que vale a pena falar disso outra vez. Alguns caminhos que trilhei desde que sai de São Paulo em fevereiro de 2006, passando pelos Estados Unidos e chegando finalmente ao Japão. Depois contar sobre os caminhos que percorro agora, principalmente com os sons e as imagens de hoje.
A história começa mais ou menos assim,















Minha passagem pela gringolândia, antes de dizer o que acontece nas terras de cá, foi interessante. Passei um bom tempo em Nova York e por lá aprendi um pouquinho mais. Minha recomendação é: visitem antes que acabe.Tá bom: um certo exagero nisso, mas vamos aos fatos. NY é uma cidade encantadora, com muita vida e um grande coração. Comparações com São Paulo são inevitáveis: gente pra caramba, boa comida, muitas línguas pelas ruas, música, barulho, carros, bikes, mais gente e mais carros. O problema é que ela está enloquecendo da pior maneira possivel. O 11 de setembro tem bastante responsabilidade por isso. Todo o tempo e em todo lugar vc escuta alguma mensagem dizendo “que se ver algo estranho, supeito, deve procurar um policial ou algum funcionário do local”. A mensagem acaba sendo: todos são supeitos! Tenha medo! Não confie em quem está a seu lado! NY tem um bom coração, mas quanto à cabeça não tenho a menor idéia de onde está. Mesmo assim, a resistência continua e as pessoas tentam viver como podem. Um bom exemplo desse povo vcs encontram aqui: www.criticalresistance.org Um grupo que vem faz muitos anos lutando contra o complexo de prisões nos U$A. Situação difícil, país que detem a maior população carcerária do mundo (mais de 2 milhões de pessoas), uma crescente política de criminalização da pobreza, muitos presos políticos e censura. Fiquei um tempo com eles em NY e isso me ensinou muito sobrepolítica estadunidense, Panteras Negras anarquistas e esperança na barriga do diabo...rs O tempo que também estive em Peekskill (pequena cidade no estado de NY) foi bom. Meu amigo Scott está lá ensinando e eu pude visitá-lo e trabalhar com isso. Isso ajudava a passar os dias que estavam congelantes (chegou a fazer ?11?c). Antes de partir de NY falei com algumas pessoas de um projeto muito legal sobre saúde mental e autonomia. Chama Icarus Project e estão trabalhando com propostas de um política de saúde mental autonomista. Confiram: www.theicarusproject.net Saí de NY e minha última hora na Big Apple, acompanho um protesto pelo assassinato de Sean Bell, jovem negro de 23 anos que foi executado pela polícia novaiorquina. Triste coincidência como polícia é polícia em qualquer lugar do mundo, resumindo: violenta, racista, autoritária e no caso de NY, a maior força militar urbana do mundo. Sena Bell foi morto quando a polícia abriu fogo contra seu carro disparando nada menos que 50 tiros. Isso foi em fevereiro e até agora ninguém sabe por que isso aconteceu direito. A defesa da polícia disse que eles agiram pelo benefício da dúvida. Ou seja, em NY a polícia pode te matar se o policial achar que corre perigo e ponto final. Isso mesmo, se o policial “achar” que você é um suspeito ele pode matar você, depois perguntar e nada vai acontecer. Alguns anos atrás algo parecido aconteceu quando policiais de NY fuzilaram com 48 tiros um jovem africano na frente de sua casa. Igualmente o argumento foi que ele era “suspeito”.
Saio de NY e vou parar no deserto do Arizona. De um frio congelante para um calor escaldante. Phoenix é uma cidade curiosa: ela está onde não deveria existir nada. Uma cidade enorme no meio do deserto. Um lugar onde nunca chove e que está cheia de carros e concreto. Da pra imaginar? Tudo é longe pra caramba e quase impossível encontrar vegetação diferente de coqueiros, grama e cactus. Mas estava eu ali visitando minha querida amiga Amelia - uma italiana-americana (como ela mesma me disse) que trabalha em um sindicato organizando trabalhadores latinos de uma rede de hotéis. Uma sugestaão é assistir o filme Pão e Rosas de Ken Loach. Mostra bem como andam as coisas no sul do país dos bravos e forte. Ali pude conhecer outra grupo chamado No Más Muertes “No more Deaths” www.nomoredeaths.org . Grupo de apoio humanitário que vai para o deserto ajudar gente que está atravessando o deserto a pé para chegar aos Estados Unidos. Uma caminhada de pelo menos 3 dias e 3 noites pelo deserto. Você leva apenas uma garrafa de água e um pão, nada mais. Esse grupo vai de carro por todo o deserto deixando garrafas de água e comida para possíveis pessoas que estarão vindo pelo deserto. Desnecessário dizer que a polícia da fronteira odeia todos eles. Quando funcionários do governo encontram essas garrafas de água e comida, sempre furam as garrafas e levam a comida embora. Eles tentam também intimidar o grupo com ameaças físicas e possíveis processos, mas o argumento do grupo é imbatível: ajuda humanitária internacional. A ONU e a Anistia Internacional reconhecem a importância de grupos como este no deserto do Arizona, que vem ganhando cada vez mais caráter como zona de refugiados.Infelizmente não pude ir para o deserto com eles, pois na semana que estava por lá eles estavam planejando outras ações na cidade. A repressão aos imigrantes é absurda e violenta, e não tenho dúvida que nessa parte o fascismo é declarado. Apesar da repressão não diminuir na fronteira com o México e o muro que foi construído para dificultar a passagem dos mexicanos o processo é irreversível. As pessoas vieram pra ficar e quanto maior a repressão, maior a resistência de todos os latinos por lá, e eles tem mais é que vir! Andando pelos Estados Unidos fica claro que toda sua riqueza e opulência nada mais é do que resultado direto de anos e anos de exploração (eu sei que não precisa ir para lá para saber disso, mas...). A situação dos indigenas é lamentável, os negros continuam discriminados e latinos, africanos e asiáticos são uma espécie de subcategoria de pessoa. Eles utilizam uma expressão para designar quem é o verdadeiro americano aqui: wasp – white-anglo-saxon-protestant. Mas por favor, não pensem que todos por lá são “estranhos”. Todos esses grupos que citei até agora foram feitos por gente que não concorda com Bush, com racismo, preconceitos mil e estão dispostos a lutar para mudar isso. Gente boa e gente “mais ou menos” estão por todas as partes. Em compensação a comida estava ótima. Autêntica comida do Arizona: burritos, quesadillas e quacamole. Viva Zapata!!!Deixo o Arizona e vou para San Francisco, Califórnia. Reza a lenda que em San Francisco o verão dura o ano inteiro. Depois de sair do clima abaixo de zero de NY e passar pelo deserto do Arizona, encontrar o sol com a brisa do mar de San Francisco foi ótimo. Fiquei com minha querida amiga Toya na parte central da cidade chamada Civic Center. Bem rápido descobri que estava entre os “loucos”. Realmente é incrível a quantidade de moradores de rua, usuários de drogas e ex-internos de clínicas psiquiátricas pelas ruas. San Francisco sofre hoje o resultado da especulação imobiliária da última década. Muita gente que não podendo pagar o aluguel foi parar nas ruas e albrgues. A cidade foi invadida por yuppies endinheirados do mundo cibernético (sabe o Google que a gente adora? Está em San Francisco) fazendo todos os preços subirem. Uma gente que vive em um mundo tão politicamente correto que chega a assustar, afinal onde estão as contradições humanas? Quanto aos usuários de drogas acho que não preciso explicar muito: California Dream, lembra? Foi bastante educativo conhecer uma loja que vende todo tipo de fumo que você pode imaginar, inclusive “marijuana”. Sim, em San Francisco o uso da maconha é legalizado, desde que vc tire uma carteirinha provando a necessidade terapeutica de tal erva, coisa não muito dificil de se fazer. Já os ex-internos temos a consequência de uma reforma psiquiátricas sem propostas adequadas e com uma política um tanto quanto doida que fez com que muitas pessoas se tornassem moradores de rua. Após anos de internação, as pessoas perderam todo vínculo familiar e comunitário, tendo muitos problemas para se readaptar ao mundo do lado de fora dos muros das clínicas. Como o clima é favorável o ano inteiro, fica mais “fácil” viver nas ruas da Califórnia que no inverno de NY ou no deserto. De qualquer maneira, San Francisco e Oakland são cidades muito boas. Oakland é onde ficam muitos bairros pobres, a concentração de latinos e africanos é maior e evidentemente onde o batuque é mais animado. Pude ir para uma feira livre e comer autêntica comida africana (acreditem se quiserem, mas a melhor comida que provei foi da Etiópia), tocar com gente de toda América Latina e África em uma big band improvisada ao lado da estação de trem - digasse de passagem outra coisa óitima por lá (você pode até entrar com sua bike nos vagões). Valeu o tempo de alguns dias para tocar, dançar e fazer bons amigos. A capoeira angola do grupo Fica foi bastante inspiradora também. Um povo bonito, gentil e digno. Fazem uma capoeira rica e forte que vai além das fronteiras e dos doláres do Tio Sam.
Foi com eles que acabei indo parar em um dos melhores shows da minha vida: Skatalites! Os tiozinhos do ska jamaicano em carne e osso na minha frente. Powerfull!! Foi incrível. Totalmente recomendável para combater o tédio e o mau humor da vida apressada e enfadonha. E foi assim que parti da gringolândia para a terra dos samurais, gueixas e chá amargo.Como eu havia dito, o Japão não é a Bahia, mas é lindo. Salta aos olhos a organização e limpeza de todas as ruas . Eu afortunadamente chego quando começam a florecer as cerejeiras, ou como eles falam, sakura.















E bem rápido você começa a se dar conta de coisas interessantes. Primeiro: o povo japonês me parece muito simpático e receptivo nas grandes cidades. Quase todo mundo com quem estive, de algum modo foi muito simpático e educado. Estão sempre fazendo milreverências e sempre dizem por favor e obrigado em todas as frases. Quando eu digo que não falo japonês (usando meu tosco japonês) eles daão um jeito de falar inglês, espanhol e até mesmo português (claro que da maneira tosca deles), mas tenha certeza que você não vai ficar na mão. Mas nem pense que no Japão é comum as pessoas falarem inglês. Uma tremenda mentira que ouvi no Brasil. Falam inglês povo engravatado dos grande centros e alguns universitários, algo como SãoPaulo (Av. Paulista-R. Augusta-Circuito “moderninhos”), mas fora daí você tá lascado. E quandode nenhum modo você consegue se comunicar, vale a mímica - sua e deles. Pacientemente eles te ensinam o que vc precisa saber (precisei ir em uma lan house imprimir umas folhas e foi um grande desafio. Ninguém entendia o que eu precisava e tudo, absolutamente tudo estava em japonês, apenas kanjis, inclusive os comandos da impressora, mas dei um jeito...).Bom, de volta às ruas. Não dá pra não perceber a quantidade de bikes por aqui. Todo mundo usa. Gente que vai pro colégio, homens de terno e gravata indo pro trabalho, meninas patricinhas de salto alto, velhinhas voltando da feira, senhores passeando. Incrível mesmo. Dá uma olhada na foto: eu nas ruas de Kyoto e uma mina de sobretudo e sandália andando de bicicleta. E viva a bicicleta!




















Afinal de contas é rápido, econômico, barato, saudável e não polui. Recomendo então: http://www.bicicletada.org/
Das ruas para os bares e cafés. Parece que o Japão só escuta musica brasileira! Muito comum você entrar num café ou bar e tocar bossa nova, samba ou mpb. Veja também que os japoneses possuem um ótimo gosto musical, não pela música brasileira apenas, mas pela abertura à outras coisas. Eles escutam muita música da África e muito jazz. Falando em música boa, vejam isso: www.transito.zip.net O doido do Velot vem escrevendo muito bem e dando ótimas dicas da música mundial. Tem coisa da periferia de Sampa até do underground holandês. Diria que minha viagem nos últimos dois meses estão embaladas pelo que está aqui... vale a pena. Outra coisa que é muito bacana, que sempre ouvimos falar, é a tal mistura da modernidade e tradição. Verdade. Enquanto as ruas estão cheias de maquininhas que vendem desde comida e cerveja, muitas mulheres estão de kimonos pelas ruas. Quando fui para Kyoto pude ver uma gueixa de verdade atravessando a rua. Acho que foi uma das coisas mais bonitas que vi. Absurdamente linda, parecia sair de um livro de arte. Quase fui falar com ela, mas haviam alguns turistas idiotas que pensavam que ela era um souvenier qualquer e quase derrubaram a coitada dentro do rio. A velha diferença do turista e do viajante, não? Enquanto o viajante escolhe um caminho e tenta aprender sobre ele e as pessoas que estão nele, o turista apenas busca o melhor foco para sua foto sem nem ter idéia do que isso significa. Está bem que talvez essa gueixa não ficaria de papinho com um estrangeiro na rua, mas seria legal saber o nome dela e se haveria algum lugar para conhecer mais sobre essa arte. Além dessas figuras bonitas na rua, difícil descrever a sensação de entrar em templos e castelos com mais de 800 anos.














Agora estou buscando por um bom lugar para sentar e meditar com monges budistas. Sei também de alguns anarquistas que moram na cidade vizinha e em suas reuniões discutem técnicas de ação direta e de meditação. Eu gostei disso. Nos próximos dias pretendo também conhecer um grupo de psicólogos que estão trabalhando com questões de Migração. Há uma grande comunidade latina, de árabes e chineses aqui. Muitos desafios com educação e adaptação. Vamos ver como vai ser.E asim estou, meus amigos. Morando em uma casa que tem tatame e que não pode entrar calçado. O duro é tomar café da manhã comendo arroz, mas como diz o ditado: em Roma como os romanos.Espero que vocês estejam em paz e que possam ter uma vida feliz, repleta de coisas boas, com força e paciência para superar os problemas. Acreditem, sigam em frente e contem comigo, não tenho como dizer o tanto sou afortunado por conhecê-los.Um beijo e um abraço enorme. Saudade.