domingo, 31 de janeiro de 2010

Pedalando pelo litoral sul da Bahia ou algo sobre o mar azul.

O pedal na Bahia teve início na cidade de Eunápolis. Interior tranquilo. Parto em direção a Arraial d´Ajuda. Alí, diante do mar azul e do céu limpo começo o processo de cura. Sabia que cada pedalada era uma nova chance para deixar o que tinha que ficar pra trás e um outro modo de encontrar o que estava por vir. Percorri, com exceção do trecho Barra Velha-Veleiro, todo caminho pela areia. O segredo é esperar a maré baixar e secar, depois pedalar e ir parando quando sentir vontade. Fora desse horário, que acontecia duas vezes por dia, era praticamente impossível pedalar por conta da areia que ficava fofa. No primeiro dia fui de Arraial a Trancoso. Praias lindas que por muito pouco não me deixaram ir de tão boas! Definitivamente o mais encantador é o que está entre um lugar e outro. O que acontece é que há praias praticamente desertas por que o acesso é muito dificil pelas estradas de terra ou somente pela areia. É necessário andar vários kilometros para se chegar a algumas delas. Acampava exatamente nesses trechos onde não havia ninguém. Apenas você, o céu, o mar e um pequeno barco de pescador lá longe. Houveram trechos onde o acesso é proibido para "pessoas não autorizadas", algumas reservas, terras griladas e zonas de proteção ambiental geralmente com cercas e cartazes de "proibida entrada". Como não respeito a maior parte desse tipo de demarcação (muros, cercas, fronteiras, serão mesmo necessárias?), e eu me autorizo a ir onde me interessa, seguia adiante, pulando porteiras e cercas, procurando regiões para passar o restante do dia sem ser incomodado, e preferencialmente sozinho. Outra vez faço uma pausa para falar da importância da atitude que chegamos em um lugar. Em nenhum momento fui impedido de seguir adiante em minha viagem. Sempre conversando e tratando de respeitar (isso sim me interessa!) o modo de ser e viver das pessoas locais. Os melhores lugares para acampar e me banhar foram dicas dos moradores. No terceiro dia passei por Coruípe e vi uma das praias mais lindas do mundo, a praia do espelho. Pena ser um lugar nada receptivo devido aos condominios de luxo e os candidatos a capa de "caras" espalhados pela areia. Estava com fome e pensei em comer algo por alí, mas desisti quando descobri que apenas para sentar num dos bares/restaurante tinha que desembolsar no mínino 50 reais. Fui até Caraíva, um lugar encantador, mas nessa época totalmente ocupada pelos seres bizarros saídos do "universo paralelo", coisa que me intriga e sempre me dá vontade de dizer para eles ficarem lá já que gostam tanto e não voltarem para o universo do lado de cá... ops, autoritário eu? imagina! e chega de reclamar! Segui adiante até Barra Velha com a intenção de conhecer a aldeia dos índios Pataxós, povo originário dessa região da Bahia. Alí encontrei pessoas lindas e muito receptivas, balsamo para minha alma! Finalmente pessoas que me interessavam e que me despertavam alguma vontade para compartilhar. Cheguei no dia 5, exatamente quando começava a festa de Santo Reis, e o que era para ser apenas uma rápida passagem, durou 4 dias. Continua...
Vista da cidade de Arraial.Passando pela Lagoa Azul... onde estão aquelas duas crianças? Pedala!
o sol nascendo na frente da minha barraca.Rio dos FradesPraia do Espelho IPraia do Espelho II Praia do Espelho III
Passagem para Caraíva... a praia acaba e é necessário pegar uma trilha. Trilha sem mar.Rio Caraíva.A vila de Caraíva.Santo Forte. A viagem ainda não está nem na metade e meu coração ainda quer mais...

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Pedal pelo litoral: da série "La Jornada"

Comecei a pedalar em Ubatuba um pouco antes do ano novo. O caminho é tranquilo em direção a Parati-RJ. O que mata mesmo são algumas ladeiras, mas nada que seja impossível e as descidas realmente são incríveis! Não dá pra forçar, caso contrário depois de uns 30 km você pode começar a se lamentar... Mas é exatamente na divisa entre São Paulo e Rio que a coisa fica mais tranquila e o terreno mais plano. Pedalei com pouca bagagem e isso fez muita diferença. Levei uma barraca, saco de dormir, algumas ferramentas pra bike, duas mudas de roupa, água (sempre, muita água!), facão, protetor solar e um punhado de castanhas. O resto você vai improvisando no caminho. E os tipos que encontra costumam ser muito amáveis e receptivos. Acho que talvez fiquem encantados com a possibilidade de alguém estar fazendo algo que eles também gostariam de realizar. Vai saber. Não foi raro encontrar alguém que dizia que um dia faria a mesma coisa: sair por aí sem pressa e por um bom tempo num bike ou mesmo caminhando. Claro que palavras como "por favor" e "obrigado" geram coisas incríveis. Evidentemente você também deve tentar passar o mais despercebido possível, não chamar a atenção é uma boa estratégia para evitar aborrecimentos. Ficava muito na minha, evitava as aglomerações, os turistas e curiosos, e de algum modo eles também me evitavam, afinal você não esta com sua roupa de festa e não faz a barba a cada dois dias, se é que me entendem... Levei 6 horas no percurso entre Ubatuba e Parati, aproximadamente 80 km pela BR. Peguei um bom trecho com chuva e isso atrasou bastante as coisas. Depois coloquei a bike num barco e fui em direção a praia de Itanema, onde passei meu ano novo debaixo d´água segurando uma lona preta com outros bons amigos. Foram três dias de chuva sem pausa! E no dia 2, quando o tempo melhorou, estava na hora de partir. A Bahia nos esperava.
Início da Jornada: Terminal Rodoviário Tiête. Indo em direção ao litoral norte.

Pequeno caiçara concentrado na tacada.

Pausa para uma água fresca e saber das condições da estrada.

Bike viajando por Parati. Duas horas no mar até Itanema.

Acampamento na praia.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

A respeito dos calçados e dos pés ou sobre pedalar pelo litoral.

Voltamos. E no ritmo da Bahia, logo, não tenha pressa. Falaremos da última jornada vivida por esse que lhes escreve. De Ubatuba-SP a Itanema-RJ e depois de Eunápolis-BA a Conceição da Barra-ES de bike. Aproximadamente 500km de pedal pelos mais diferentes terrenos e as mais incríveis pessoas. Assim sendo, falemos primeiro de um fiel companheiro: meu par de tenis. Fundamental falar disso porque foi com ele que andei por essa região. As vezes lhe dava um descanso, mas em boa parte do caminho estava alí, firme, sujo, vivo, roto, rindo, falando mesmo. Duvida? Nossos pés são sagrados e deveriamos tratá-los como tal. São eles que nos conduzem, nos sustentam, nos avisam de intempérios momentos e se vamos ou não seguir a viagem. Devemos oferecer a eles lugar de destaque em nosso cuidado com o corpo. Relega-los é trabalho dobrado e cansaço desnecessário. Claro que não devemos ser tão dependentes dos calçados que usamos. Pisar no chão e sentir a terra em cada parte, em cada grão de areia ou grama é fundamental. Porém não sou um hippie ou primitivista pra achar que devemos incendiar nossos calçados e nossas roupas, então... Meu tenis esteve comigo por quase dois anos. Veio de Ogaki, no Japão e caminhou por outros dois continentes antes de chegar aqui. Experimentou o concreto, a lama, o asfalto, a água salgada do mar, o mangue, o mato, a água doce dos rios. Caminhou, pedalou, dirigiu e voou. Isso da maior intensidade e frequencia para a menor. Ficou em São Paulo e não se pode fazer muito por ele agora. Agradeço esse tempo que me foi útil e agradeço aqueles que o fizeram para que eu os utilizasse. Lembrei de uma história zen. Contam que um importante monge possuia uma chicará de chá da qual nunca se separava. Ele a possuia a muitos anos e tinha adoração pelo objeto, um artefato raro e de beleza única. Num dia qualquer seu discípulo, limpando os objetos na mesa, por um momento de distração esbarra na tal chicará e a deixa cair, simplesmente a destruindo sem possibilidade de reparo. Ele fica apavorado e sem qualquer reação. O que vai fazer agora? O vai dizer ao monge? O dia passa e um pouco antes da hora do chá o aluno respeitosamente se aproxima do monge e diz:

"O senhor poderia falar algo sobre as coisas que amamos e a morte?"

"Claro!" diz ele. "Importante pensar sobre isso. Acontece que a morte vem para todos. Tudo aquilo que surge um dia desaparecerá. Nada, inclusive o que gostamos tanto, pode continuar a existir para sempre nesse mundo."

O discipulo escuta atentamente e responde:

"Ah! Entendi. Então, deixa eu te contar uma coisa que aconteceu hoje de manhã..."

domingo, 10 de janeiro de 2010

Dias de cura

Passando apenas para arrumar um pouco a casa. Estou próximo a Prado, extremo sul da Rota do Descobrimento, Bahia. Continuo sem acesso a internet e provavelmente volto a escrever na próxima semana. Acredito que nos próximos dias estarei no Espirito Santo. Creio ter pedalado e empurrado minha bike por entre estradas de terra, areia, falésias, rios, mar e asfalto por uns 180 km. Não estou bem certo o que contar agora, apenas que essa jornada tem me oferecido um modo único de entender minha terra, minha alma e meu povo. Que estar só nesse dias não me tortura, mas me deixa calmo e com uma paz rara. Um processo as vezes árduo que busca por coerência, amor e verdade. Recebi o poema abaixo de uma amiga querida, a Marcia Luck, e fico por aqui com ele. Feliz ano novo!

NOVOS DIAS - SÉRGIO VAZ

“Este ano vai ser pior...
Pior para quem estiver no nosso caminho."

Então que venham os dias.
Um sorriso no rosto e os punhos cerrados que a luta não para.
Um brilho nos olhos que é para rastrear os inimigos
(mesmo com medo, enfrente-os!).
É necessário o coração em chamas para manter os sonhos aquecidos.
Acenda fogueiras.
Não aceite nada de graça, nada. Até o beijo só é bom quando conquistado.
Escreva poemas, mas se te insultarem, recite palavrões.
Cuidado, o acaso é traiçoeiro e o tempo é cruel,
tome as rédeas do teu próprio destino.
Outra coisa, pior que a arrogância é a falsa humildade.
As pessoas boazinhas também são perigosas,
sugam energia e não dão nada em troca.
Fique esperto, amar o próximo não é abandonar a si mesmo.
Para alcançar utopias é preciso enfrentar a realidade.
Quer saber quem são os outros? Pergunte quem é você.
Se não ama a tua causa, não alimente o ódio.
Por favor, gentileza gera gentileza. Obrigado!
Os Erros são teus, assuma-os. Os Acertos Também, divida-os.
Ser forte não é apanhar todo dia, nem bater de vez em quando,
é perdoar e pedir perdão, sempre.
Tenho más notícias: quando o bicho pegar, você vai estar sozinho.
Não cultive multidões.
Qual a tua verdade ? Qual a tua mentira? Teu travesseiro vai te dizer.
Prepare-se!
Se quiser realmente saber se está bonito ou bonita, pergunte aos teus inimigos,
nesta hora eles serão honestos.
Quando estiver fazendo planos,
não esqueça de avisar aos teus pés, são eles que caminham.
Se vai pular sete ondinhas, recomendo que mergulhe de cabeça.
Muito amor, muito amor, mas raiva é fundamental.
Quando não tiver palavras belas, improvise.
Diga a verdade.
As Manhãs de sol são lindas,
mas é preciso trabalhar também nos dias de chuva.
Abra os braços. Segure na mão de quem está na frente e puxe a mão de quem estiver atrás.
Não confunda briga com luta. Briga tem hora para acabar,
a luta é para uma vida inteira.
O Ano novo tem cara de gente boa, mas não acredite nele.
Acredite em você.
Feliz todo dia!