Lembro do buteco do Seu Zé, lá na Barra Funda. Homem de poucas palavras, mas olhar sério e a mais pura eficiência na execução dos tratos que um verdadeiro pé sujo precisa ter para ser um buteco. Esses lugares que precisam escrever em suas paredes que são um "boteco" são na verdade lugares desprovidos de personalidade e até mesmo caráter. De buteco mesmo não tem nada. Alí eles dizem querer que o cliente se sinta em casa, mas desde que esteja pagando direitinho e assuma o lugar do espectador, nunca e jamais o do protagonista. No buteco do Seu Zé é diferente. Como lá ele não mede esforços para te fazer sentir bem, ele simplesmente fecha na hora que der vontade, mesmo que você tenha acabado de abrir a primeira cerveja. E as vezes ele espera você deixar de desabafar o pé na bunda que levou ontem, mesmo que não tenha dinheiro nem pra cachaça. É um homem justo. Lá não tem essa de múltipos cartões para pagar a conta. Dinheiro ou cheque. Não há muitas opções para comer além dos salgados na estufa e dos ovos coloridos e amendoins de saquinho. Não tem nem cardápio. Com o Seu Zé não adiante reclamar e nem falar mal da vida. Para você terem uma idéia, uma vez a cerveja congelou. A gente chamou o velinho e disse isso para ele. Ele não teve dúvida! Pegou o outro copo da mesa, virou a garrafa e deu uma "esfregadinha na bundinha" da bendita e quando os copos estavam cheios daquela mistura de gelo e cerveja, todo satisfeito disse: "Pronto! agora tá bem gelada e é só fazer isso que tá tudo certo." Santa sabedoria de bar! Até parece que ali se desperdiça cerveja porque ela gelou demais! Seu Zé é um homem educadíssimo e basta manter a postura de respeito que um estabelecimento desse merece que todo mundo fica feliz. Minhas idas ao bar do Seu Zé me ensinaram que só mesmo no capitalismo de bundão(e tem outro?), de homens médios e mulherzinhas, é que se engole sapo para fazer crer que o cliente tem sempre razão. O verdadeiro bar é um espaço de convivencia quase sagrado e há de se saber comportar. Há regras mínimas de conduta que precisam ser observadas. Uma delas é nunca ficar brigando por bobagens com os funcionários e dar uma de gente mimada. A lógica do "eu tô pagando" não funciona em lugares que se respeitam. Tá pagando e acha que pode falar o que bem entender? Quanta ingenuidade! No Bar Saci, onde sou um dos trabalhadores, de tempos em tempos surgem essas figuras. Mas como falei aqui antes, vamos na caminhada do processo civilizatório dessa gente que tem o rei na barriga e que faz cara feia pr'aquilo que não entendem. Foi assim o acontecido. Quatro amigos entram no Saci. Sentam num dos cantos e pedem uma cerveja. Eis que em determinado momento, uma delas faz um pedido que naquele momento não vai poder ser atendido porque não tem a fruta para seu drink. Ela pede outro e incrivelmente a coisa também acabou de acabar. Ela já fica puta e irritada, afinal o que ela poderia pedir agora?! Tentei remediar a situação e oferecer um substituto. Ela reclama do preço e eu explico que vai ter desconto, afinal a Casa do Saci quer um comércio mais justo e honesto. Desconto na bebida? é isso mesmo, lá isso as vezes acontece. Eis que a amiga, que até então apenas observava começa a reclamar do bar, do cardápio e da demora. Eu que não sou besta nem nada, e que tenho a proteção dos sacis todos daquela região, mui tranquilo, olho para ela por cima de meus óculos e digo para ela não se desesperar. Ainda dá tempo dela ir até o bar da esquina que tem um cardápio muito melhor e mais completo que o nosso. Lá ela não vai ter aquele tipo de problema. A terceira pessoa intervem e pergunta se estou mandando eles irem embora. Digo que nunca! Eles me entenderam mal. Eu apenas lembrei do dito popular que quando a gente fala o que pensa, ouve... Era só isso. Depois pacientemente expliquei o que tinha acontecido com os ingredientes e disse que o bar tinha uma proposta muito clara. Depois disso tudo fico mais calmo. E adivinhem só? A cerveja ficou trincando e na mesa de quem ela congelou? Sim, deles mesmos! Na hora disse para eles que ia dar tudo certo. Virei a ampola em cada copo dando uma esfregadinha na bundinha e fui continuar a atender outras mesas. Eles não disseram nada. Voltei para minha casa pensando que faz um bom tempo que não vou beber uma no Seu Zé. Preciso ir lá dar um abraço no velinho. E onde ele fica? Sinto muito, mas não conto de jeito nenhum. Agora o Saci fica lá na rua Vanderlei, 702. Dinheiro ou cheque. Apareçam!
3 comentários:
trabalhar com os sacis tá te deixando mais serelepe!
isso aí, educando esse povo das perdizes!
graaaande alê!! trabalhador do saci é assim: aprende ali ensina aqui! vamo beber uma no seu zé! bjs
Fala sério Alê! Eu sou barra funda! Bora tomar uma lá no Zé! Preciso conhecer este estabelecimento...
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